sexta-feira, 20 de setembro de 2019





O tempo a partir das serpentes

Projeto exposição para a Capela do MAM - Museu de arte Moderna da Bahia. Inscrito no setorial das Artes. SECULT - Ba. 2019/20
Estudo remontagem para outros espaços  
Apresentação

Este projeto propõe uma exposição para a Capela do Museu de Arte Moderna da Bahia, MAM, chamada O tempo à partir das serpentes. Seu conteúdo versa sobre memória e cidade. Memória de dois grandes artistas brasileiros que chegaram na casa dos 100 anos em 2016 e 2017: a fotografa e escritora Zélia Gattai e o artista visual Mestre Didi, e de dois artistas contemporâneos meus, que nesses mesmos anos fizeram suas passagens: Ivana Chastinet e Lelo Souza da mata. Memória do bairro Rio Vermelho onde Zélia Gattai morou grande parte de sua vida e onde Mestre Didi possui o monumento urbano Cetro da Ancestralidade, dedicados na Nanã e seus filhos, entre eles Ewá, um dos orixás de D. Zélia, irmã de arco Iris de Oxumaré,  Orixá com quem parto do Cetro da Ancestralidade para ver o Bairro 2 de Julho, famoso pela sua diversidade, e onde habitaram a Ivana Chastinet, diretora teatral e performer e Lelo Souza da Mata, artista visual com foco na fotografia.

As serpentes são atributos dos Orixas Ewá e Oxumaré, Orixas do arco íris, filhos de Nanã, tempo que se forma o Aiyê, sistema solar que se encontra a terra. Ewá as águas no ar do céu, que permitem que a luz seja refratada gerando o belo fenômeno atmosférico, ligado ao mito da diplomacia e prosperidade. São tema para uma trilogia em pintura que dá nome a exposição e onde apresento uma visão, em dialogo de signos clássicos, com os mesmo  da cosmogonia africana, aqui as serpentes, que tem na noite um Oroboros, quando a serpente morde o próprio rabo, símbolo da conclusão de uma etapa de vida, e dedicado ao Orixá alquimista Ewá. O dia como uma possibilidade posterior às tempestades, em uma serpente arco íris Oxumaré, e a aurora, quando a noite encontra o dia, em um caduceu, emblema de Hermes- Mercúrio, deus Greco romano da comunicação, que se torna com as serpentes, dos filhos de Nanã, em um Caduceu para Exu, senhor das comunicações africanas. A inspiração para essa trilogia em pintura, creio vem da minha participação no “Bori” do artista visual Ayrson Heráclito, onde performo Oxumaré. A explosão do meu colega no cenário nacional e internacional das artes visuais, leva minha cabeça em orixá para os quatros cantos do mundo, e na cidade da Bahia sincronicidades interessantes se fazem revelar.

Nos anos de 2016 e 2017, o Rio Vermelho e o 2 de Julho passaram por reformas, que impactaram bastante a imagem urbana desses bairros.  A Casa do Rio Vermelho, morada de Jorge Amado e Zélia Gattai, tornada instituição cultural aberta ao público, um marco da arquitetura baiana, do celebre casal de artistas, recebe minha visita reflexiva em formato audiovisual: Anarquistas graças a Oxalá, parte do Cedro da Ancestralidade na orla do Rio Vermelho, que tem quase a sua frente, no Largo de Santana a escultura do casal Amado, seguindo até a casa do Rio Vermelho, revelando o bairro e a morada da modernidade baiana, em reflexão sobre a memória centenária de Zélia Gattai, que em 2016 fez seus 100 anos. Do mesmo Cetro da Ancestralidade, de Mestre Didi que fez seus 100 anos em 2017, parto para o bairro 2 de Julho, que tem em um dos seus acessos, a Esquina do Arco Íris, por sua diversidade de gênero, raça, classes sociais. O bairro 2 de Julho possui uma deslumbrante vista da Baia de Todos os Santos, enseada que faz a cidade possível. Bairro de intelectuais e artistas é revisto no audiovisual intitulado, Artistas Graças a Olurun. Os dois audiovisuais, são como parte de um mesmo filme sobre memória e cidade, compõem um discurso sobre a importância da cosmogonia Iorubá, na construção cultural da cidade de Salvador.

Na entrada da Nave Central da capela, o piso como uma pintura expandida feita de luzes. Na parede direita, com luz focal, ficará a trilogia em pintura, que dá nome a exposição; Na parede esquerda com luz focal, textos reflexivo sobre conteúdos, conceitos e a montagem, ficha técnica, marcas institucionais e patrocinadores.

Na nave onde antes era o altar, os audiovisuais. O piso tem iluminação voltado para ele, e bancos escalonados de desenho limpo e o mais confortável possível para o espaço.

Na nave colateral esquerda uma instalação para a parte água do arco íris, As águas do céu de Nanã, traz a memória de Ivana Chastinet, artista com quem tive uma intensa vivência na construção de ações políticas e artísticas no bairro 2 de julho, e que acompanhei seus últimos momentos presenciais, a virtualização de sua lembrança, a resistência de seu legado. No fundo da nave colateral, na parede branca que tem um nicho, um aquário é instalado, contendo uma moldura de algas, para receber a projeção do registro da performer em Maminha, no encerramento da 3.a Bienal da Bahia, no Largo 2 de Julho. Ivana Chastinet é emoldurada, pelo nicho que tri dimensionará a imagem, com água. Aquarius com celulares impermeabilizados, funcionando em corrente contínua, apenas como porta retrato único de uma cena retirada da performance apresentada, amplia a apreensão da obra.

Na nave colateral direita instalo fotografias de Lelo Souza da Mata, visto no Arco Íris, feito uma pintura expandida construída por projeção de luzes nas paredes, piso e teto, onde estas fotografias são guardadas em caixas de acrílico, que possuem iluminação própria. As imagens podem serem vistas dos dois lados. São sustentadas em uma teia de cabo de aços, tencionáveis, que contém a rede elétrica encapada e presa a esses cabos. A seleção de fotografias de Lelo Souza da Mata, é meu reconhecimento ao trabalho do artista, com quem interagi em muitas ocasiões no bairro 2 de Julho, território comum as nossas existência na cidade, e em eventos do calendário cultural, que recortei do Santo Antônio, 2 de Julho e Rio Vermelho, onde o Lelo registrou o Cortejo do dia da nossa independência, o 2 de Julho, a Parada Gay, personagens do Bloco Rodante, no  Santo Antônio, a Festa de Santa Barbara, o Enceramento da 3.a Bienal em nosso bairro 2 de Julho e a Festa de Yemanjá no Rio Vermelho. Um pequeno céu da sua produção que conta com muito, muito mais.

O tempo a partir das serpentes busca uma apropriação espacial da capela para falar da cidade de Salvador e suas memórias, com um recorte de viés da contribuição Nagô, que permeia uma camada entre o imaginário e o dia a dia, da Cidade da Bahia. Com sensibilidade fala das doídas cirurgias que vão se processando na cidade, no tempo que ao mesmo tempo consome, nos leva ao infinito de nossas horas.